
A seca dos rios e a destruição da floresta agravam as precárias condições de vida das populações amazônicas. Não serão as falsas promessas governamentais e patronais que irão tratar do atual colapso ambiental – causado pelo capitalismo. A única solução é a que vem da luta das massas trabalhadoras pela derrubada desse sistema de exploração e destruição ambiental!
Cem Flores
13.11.2025
“Nenhuma COP, desde a primeira em 1995, teve qualquer influência sobre a curva da queima de combustíveis fósseis, sobre o desmatamento e, portanto, sobre o aquecimento”.
Luiz Marques. Ecocídio. Por uma (agri)cultura da vida. São Paulo: Expressão Popular, 2025, pg. 205.
Neste mês de novembro, o governo burguês de Lula está sediando a COP30 em Belém. Para ele, será mais uma oportunidade para se vender como “líder global” – após o Brasil sediar o G20, em 2024, e presidir os BRICS, neste ano –, além de fazer seus tradicionais discursos hipócritas, completamente antagônicos à realidade e às ações de seu governo.
Ao contrário da intensa propaganda governamental e da “esquerda”, a liderança rotativa e temporária desses fóruns internacionais implica, na verdade, a defesa dos interesses do capital, tanto brasileiros quanto internacionais, especialmente do grande capital, os monopólios transnacionais. O objetivo, portanto, é mostrar-se um bom (ou o melhor!) gestor do capitalismo, subserviente aos interesses da burguesia, e instrumento da perpetuação da dominação dos patrões e da exploração e opressão das massas trabalhadoras ao redor do mundo.
A COP30 ocorre enquanto o Brasil e o mundo registram recordes no aquecimento global, cuja tendência não se reduziu nem ao menos se estabilizou. Pelo contrário, o aquecimento acelera, agravando o colapso ambiental em curso! Nunca houve o cumprimento de “compromissos” assumidos em COPs anteriores – com o fracasso do Acordo de Paris (COP21, 2015) sucedendo o do Protocolo de Kyoto (COP3, 1997). Também não deverá haver, provavelmente, a adoção de novos compromissos relevantes por esta COP. Se houver, terão o mesmo destino dos acordos anteriores: folhas de papel amarelando em gavetas para serem lidas uma vez por ano e novamente guardadas e “esquecidas”.
O mapa mostra a alta do aquecimento no mundo todo. As manchas vermelhas mais intensas indicam temperaturas recordes, concentradas na região equatorial, de florestas na Amazônia, África subsaariana e Sudeste Asiático. Também atingem América Central, Canadá, região mediterrânea da África e Europa, Europa Oriental, China, Japão e Coreia, além do aquecimento recorde nos oceanos. Esse aquecimento global é resultado do modo de produção capitalista no equilíbrio energético da Terra, com impactos destrutivos nas condições de vida e na biodiversidade.
Também se agravam os eventos climáticos extremos no mundo e no Brasil, como as enchentes no Rio Grande do Sul (2023 e 2024), as secas na Amazônia e, recentemente, ciclones extratropicais e tornados no Sul do país, para ficarmos em apenas poucos exemplos. Nesta década, os desastres climáticos no Brasil cresceram 250% e sua média anual supera 4 mil eventos, de 2020 a 2023.
Destruição causada por tornado de intensidade F4 em Rio Bonito do Iguaçu (PR). Sete pessoas morreram, quase 800 ficaram feridas e 90% das estruturas urbanas foram destruídas ou danificadas.
A preparação da COP30 em Belém segue a experiência do Panamericano de 2007, da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016: investimentos governamentais bilionários para os lucros da burguesia, incluindo, claro!, a corrupção; obras inacabadas e elefantes brancos; destruição ambiental; deterioração dos serviços públicos; remoção da população periférica e piora de suas condições de vida; e intensa exploração da classe trabalhadora nos megaprojetos. Dessas condições surgiu a massiva greve operária na construção civil em Belém, em setembro, que tratamos em publicações anteriores.
Por todas essas razões, devemos reafirmar a nossa posição comunista diante de mais esse evento da burguesia e dos seus governos:
“A COP é um espaço construído, controlado e financiado pelos capitalistas e seus governos, totalmente incapaz de reverter o colapso ambiental em curso no mundo. Apesar de propor algumas medidas para mitigar as mudanças climáticas, que nunca são implementadas, ao longo de três décadas, tal conferência em nada alterou o caráter destrutivo do capitalismo…
A COP dos patrões e dos poderosos é uma farsa montada por esses inimigos de classe e não pode ser um verdadeiro instrumento de combate ao colapso ambiental que atinge sobretudo as massas exploradas de todo o mundo. Não podemos ter ilusões com tal espaço nem compactuar com movimentos e grupos cooptados que legitimam essa farsa.
Nosso lugar é na luta, o único caminho capaz de transformar radicalmente esse sistema de devastação da natureza! Luta que precisa ter um corte de classe, separando bem quem são nossos inimigos e quem são nossos amigos: do outro lado, os governos e os políticos burgueses e os patrões; do nosso, trabalhadores e povos oprimidos. Não há conciliação possível entre explorador e explorado; entre opressor e oprimido; entre aquele que devasta o planeta e aquele que sofre na pele as consequências do colapso ambiental!
Nessa COP 30, nosso lugar é do lado dos movimentos indígenas independentes que dobraram o governo do Pará em seu intento de retirar conquistas educacionais; do lado dos operários de Belém que têm paralisado as obras por salários e condições de trabalho; do lado dos corajosos moradores da Vila da Barca que se recusam a receber o esgoto dos ricaços e dos demais bairros da periferia de Belém que resistem aos impactos da conferência!”.
O capitalismo é destruidor do meio ambiente[1]
“Tese 1. O capitalismo é insustentável em termos ambientais e a ideia de que se possa ‘educá-lo’ para a sustentabilidade pode ser considerada como a mais extraviadora ilusão do pensamento político, social e econômico contemporâneos”.
Luiz Marques. Capitalismo e Colapso Ambiental. 3ª edição, revista e ampliada. Campinas: Editora da Unicamp, 2018, pg. 69.
O capitalismo é o modo de produção absolutamente dominante no mundo, voltado para a acumulação sem fim de capital e a extração do lucro máximo para a burguesia, através da exploração desmedida tanto das classes trabalhadoras quanto da natureza. A inimaginável riqueza de um punhado de capitalistas tem sua origem na expropriação da imensa maioria da população em todo o planeta e na selvagem destruição do meio ambiente. Suas consequências são tanto a miséria e as duras condições de vida da massa trabalhadora quanto o colapso ambiental que ameaça todas as formas de vida da Terra.

Os capitalistas mais ricos do mundo (1%) detêm quase a metade da riqueza mundial (46%). A classe trabalhadora mundial (87%) não tem quase nada (15%). E a concentração no topo da pirâmide aumenta cada vez mais. Essa desigualdade de riqueza também reflete a desigualdade na destruição ambiental, da qual são principalmente os patrões os culpados!
O capitalismo, em sua atual etapa imperialista, é dominado pelos grandes monopólios transnacionais que dividiram, junto com seus estados, todo o planeta. As permanentes pressões por uma nova repartição do mundo, junto com a concorrência entre os monopólios dos diferentes países, geram contradições interimperialistas crescentes – das quais a mais importante atualmente opõe os EUA, principal potência imperialista, mas em declínio relativo, à China, potência imperialista ascendente – e constantes guerras imperialistas. As cadeias globais de produção, dominadas por esses gigantescos monopólios, impõem os padrões da mais devastadora produção capitalista em todos os países. O estado depressivo da economia capitalista mundial na maior parte deste século, a crise do imperialismo, torna a concorrência entre os capitais ainda mais exacerbada, na busca da maior acumulação e lucratividade, eliminando os limites à exploração dos trabalhadores e à destruição dos ecossistemas ao redor do mundo.
Neste século, vários autores, com diversos níveis de aproximação ao marxismo, passaram a propor o termo “capitaloceno” para caracterizar a época atual, de destruição ambientam planetária causada pelo capitalismo. Essas características inexoráveis do modo de produção capitalista estão na raiz das diversas dimensões da crise ambiental, que confluem para o colapso ambiental contemporâneo:
1. Aquecimento global recorde: 2024 foi o ano em que “todos os continentes bateram seu recorde de temperatura média”, completando uma década em que todos os anos estiveram entre os dez mais quentes já registrados. Mais do que isso, de acordo com os modelos existentes, foi o ano mais quente desde o último período interglacial, há 125 mil anos. Além disso, 2024 foi o primeiro ano em que a temperatura global superou o limite de 1,5 grau acima da média pré-industrial (utilizando-se como referência o período 1850-1900) – ultrapassando, ainda que pontualmente, a meta fracassada do Acordo de Paris.
Esse aquecimento é causado, principalmente, pelas emissões de gases de efeito estufa (como dióxido de carbono e metano), que têm como grandes emissores a queima de combustíveis fósseis, o desmatamento, os incêndios e a degradação do solo – todas causadas pelo funcionamento do capitalismo. Em termos per capita, os 10% mais ricos são responsáveis por metade dessas emissões.
Não apenas as emissões e o aquecimento estão aumentando aceleradamente, como seu efeito cumulativo e a extrapolação de sua trajetória já tornam certo um aumento da temperatura acima de 2 graus em 2050 e crescentes as probabilidades de um aumento (bem) maior que 3 graus até 2100, o que seria catastrófico para a vida no planeta e para a própria existência humana.
No gráfico da esquerda, a aceleração do aquecimento global no último meio século, superando 1,5°. No da direita: os 10% mais ricos respondem por metade das emissões de consumo (associadas ao estilo de vida), enquanto a metade da população do planeta responde por meros 10%.
2. Produção baseada em combustíveis fósseis: mais de 80% da produção e do consumo capitalistas continuam baseados na energia de carvão (mineral e vegetal, do qual o Brasil é o maior produtor mundial), petróleo e gás. O mais poluente do trio, o carvão, ainda responde por um quarto da energia primária consumida no mundo. As recentes descobertas, os novos processos extrativistas e a lucratividade aceleraram a produção de petróleo e de gás não convencionais, que batem recordes tanto em termos absolutos quanto per capita. Não há projeção de picos e posterior declínio de produção/consumo no horizonte: enquanto der lucro, o capitalismo continuará investindo em combustíveis fósseis.
A queima desses combustíveis fósseis é uma das principais fontes de emissão de gases de efeito estufa e do aquecimento do planeta. Além disso, a cadeia produtiva capitalista é extremamente poluente, da extração e do transporte ao consumo, passando por acidentes e destruição dos ecossistemas. O recente aumento da produção por fontes não convencionais (como petróleo e gás de xisto) aumenta ainda mais seu caráter poluente e os riscos ambientais.
Nesse contexto, a “transição energética” (substituição de combustíveis fósseis por energias renováveis) ocorre apenas pontualmente, em alguns nichos, o que mantém a devastação ecológica.

O gráfico da esquerda mostra a matriz energética mundial em 2023, com 32% de dependência de petróleo, 26% de carvão e 23% de gás natural. No da direita, as emissões batem recorde, ano após ano, puxadas por combustíveis fósseis. Os maiores emissores de gases de efeito estufa são a China e os EUA.
3. Desmatamento e degradação florestal: juntamente com os combustíveis fósseis, o desmatamento (corte raso da mata) e a degradação (demais formas de destruição florestal) estão entre as mais importantes causas do aquecimento. Além das emissões diretas (incêndios florestais, por exemplo), a eliminação da cobertura vegetal também reduz o armazenamento de dióxido de carbono pela floresta, ampliando ainda mais as emissões líquidas dos gases de efeito estufa. Nos casos mais graves de devastação florestal, de forma impressionante, as “florestas” tornam-se até mesmo novas fontes de emissão!
Bem mais da metade da cobertura vegetal original do planeta já foi perdida. Todas as principais causas da destruição das florestas decorrem da acumulação de capital: extração de madeira, incêndios, expansão da agropecuária e da mineração, construção de estradas e hidrelétricas, além da própria urbanização. As consequências para o meio ambiente são amplas, complexas e desastrosas: além de acelerar as emissões, a supressão das florestas afeta decisivamente as condições do solo e das águas, empobrecendo o primeiro e reduzindo o ciclo hidrológico e de chuvas. Solos mais pobres e secas contribuem para a savanização das florestas ou a desertificação de savanas ou caatingas. Desmatamento, degradação ou fragmentação das florestas (além do aquecimento) degradam o habitat natural, acelerando a extinção de espécies e reduzindo a biodiversidade.
A destruição florestal tem se acelerado no século 21, com o aumento do aquecimento e a redução das chuvas, a ampliação da estação seca e dos incêndios, além do próprio desmatamento/degradação. O maior e mais próximo risco é o chamado “ponto de não retorno climático”, quando o dano ambiental se torna irreversível e a floresta colapsa por si mesma, incapaz de se regenerar.

A devastação das florestas tropicais no Brasil, na África e no Sudeste Asiático tem a mesma causa: a expansão do agronegócio. Depois de 2015, se houve alguma mudança, foi para agravar esse cenário.
4. Degradação dos solos e desertificação: entre um terço e metade do solo do planeta apresenta algum nível de degradação (erosão, salinização/acidificação, poluição química). As causas principais estão fortemente vinculadas ao desmatamento, ao agronegócio (monocultura intensiva em agrotóxicos), à pecuária e à mineração, ou seja, à expansão ampliada da acumulação capitalista.
Dado o tempo necessário à sua recuperação (centenas de anos), trata-se de perda irreversível para todos os fins práticos. Em áreas secas, essa degradação leva à desertificação. Os mais afetados com a esterilização da terra são os trabalhadores pobres, mais diretamente ligados às atividades produtivas com a terra, o que tem causado migração em massa.
5. Declínio dos recursos hídricos: o atual colapso ecológico combina a redução da água doce disponível às demandas humanas e do capital – função de desmatamento, aquecimento, poluição de aquíferos – com o forte aumento na demanda, principalmente do agronegócio. Além de desvio crescente para irrigação e hidrelétricas, a redução da água disponível também decorre da poluição (esgotos, resíduos sólidos urbanos, indústria, mineração e agronegócio). Isso se expressa na redução do fluxo dos rios, ou mesmo sua seca, sazonal ou perene, e baixa de nível de lagos e aquíferos.
O “estresse de água” é, portanto, um grave problema que já atinge um terço da população mundial – é especialmente grave na China, Índia e no Paquistão e crescente na América Latina – tendência que deve aumentar nas próximas décadas. O par desse estresse é a seca e a aridez, que atingem de forma cada vez mais intensa até mesmo a Amazônia.
A escassez hídrica é uma das consequências do desastre ambiental mais imediatamente sentida pela população trabalhadora pobre.
6. Produção recorde de lixo e contaminação ambiental: a produção e o consumo capitalistas (indústria, mineração, agropecuária etc.), têm como consequência necessária a geração colossal de lixo industrial, cuja degradação ambiental leva décadas ou séculos, muito além da vida útil da mercadoria produzida/consumida (muitas vezes descartável, com obsolescência programada). Esse lixo capitalista é composto de resíduos diversos do processo produtivo (mercúrio na mineração, agrotóxicos na agricultura, plástico, vidro, metal etc.) e é eliminado diretamente na natureza sem esgoto (para mais de um terço da população) ou com esgoto não tratado (60% do qual vai diretamente para as águas). Recentemente, a esse grupo se juntou o lixo eletrônico, item de maior crescimento atual, bastante poluente e com baixa reciclagem.
Esse lixo se acumula em terra (lixões insalubres onde a parte mais miserável da população busca as condições de sobrevivência), nos mares (onde flutua acumulando verdadeiros continentes de lixo em todos os oceanos e afunda até as plataformas continentais, ameaçando toda a vida marinha) e no ar (com o impressionante aumento de partículas suspensas poluidoras). Após décadas de degradação de lixo na natureza, ele passou a ser onipresente, inclusive nas invisíveis nanopartículas presentes em nossos corpos, nos dos demais animais e em todas as partes do planeta.
Os maiores geradores de lixo são as cadeias produtivas globais dos grandes monopólios transnacionais e os países imperialistas, em função do modo de produção capitalista e das altas rendas. Sua ‘solução” para o problema é jogá-lo nos países dominados, com a exportação das fábricas as mais poluentes, do trabalho o mais degradante, a devastação ambiental com todas as suas consequências e mesmo a exportação direta do lixo. Como retorno, recebem fluxos de mercadorias, financeiros e de lucros “lavados”. Essa é mais uma razão a demonstrar as causas capitalistas, imperialistas, do atual colapso ambiental e que sua solução passa necessariamente pela derrubada desse modo de produção, exploração e devastação.
7. Extinção em massa de espécies: o ritmo e a extensão da extinção de espécies causada pelo atual colapso ambiental já a torna comparável às extinções anteriores, levando alguns cientistas a afirmar que está em curso a 6ª extinção da história da vida na Terra. A causa imediata é o fim dos habitats naturais dessas espécies com a perda da vegetação (vida terrestre) ou dos recifes de corais e outras espécies aquáticas (vida marinha), além dos demais impactos acima elencados do colapso ambiental em curso. As razões da destruição dos habitats são basicamente vinculadas à produção capitalista.
A coalizão capitalista do colapso ambiental
São as próprias relações de produção capitalistas, suas formas de produzir a qualquer custo, sem limites, sua busca pela permanente e crescente expansão da acumulação, e a contínua e ampliada extração de riqueza da natureza e dos trabalhadores, que estão na raiz desse colapso ambiental. Analisando os setores produtivos e as frações de classe burguesas, podemos destacar como direta e muito especialmente vinculadas à crise ambiental contemporânea as seguintes:
1. Indústria de transformação e suas cadeias globais de produção: o atual processo de transformação industrial é movido a combustíveis fósseis, assim como o transporte de mercadorias, nas suas etapas intermediária e final. Esse processo é poluidor do meio ambiente tanto pelos seus resíduos, contaminando ar, solo e água, quanto pelo lixo gerado e suas mercadorias descartáveis. Destaca-se nesse quadro a indústria bélica, hoje em crescimento diante da corrida armamentista global e o acirramento dos conflitos interimperialistas: seus “produtos” não apenas destroem vidas humanas como também são altamente poluentes.
2. Indústria extrativa mineral: a extração de petróleo e gás constitui um enorme risco ambiental em si própria, adicional ao efeito poluidor de sua queima durante o processo produtivo e nos transportes. A mineração, tanto industrial quanto o garimpo, destrói completamente o solo dos locais onde ocorre, havendo também contaminação das águas (com mercúrio, por exemplo) – deixando uma herança de destruição. Nos dois casos, é preciso acrescentar o efeito dos frequentes acidentes ambientais.
3. Agronegócio de exportação: o agronegócio é baseado no latifúndio capitalista, reduz a diversidade alimentar com sua tendência à monocultura (vinculada à maximização de lucros nos mercados mundiais), dificultando a recuperação dos solos e facilitando a propagação de “pestes”, combatidas com um volume crescente de agrotóxicos. A expansão de sua fronteira de negócios é causa de desmatamento e incêndios florestais. Esse processo também agrava conflitos no campo, com o ataque às terras das comunidades camponesas e indígenas, condições de trabalho análogas à escravidão e assassinatos de trabalhadores e lideranças sindicais e políticas por parte de milícias armadas patronais.
4. Pecuária: dentro do agronegócio a pecuária intensiva capitalista merece destaque especial, dada sua contribuição significativa ao desmatamento, com a transformação da vegetação nativa em pasto, e ao aquecimento global, com as expressivas emissões de gás metano (muitíssimo mais poluente que o dióxido de carbono no curto prazo).
5. Finanças globais: os monopólios do capital financeiro participam ativamente da devastação ambiental através dos fluxos de capitais internacionais que possibilitam a produção e a circulação dos setores capitalistas acima elencados, além de terem participações acionárias nos próprios monopólios não financeiros. A precificação das mercadorias produzidas por esses setores obedece a lógica dos circuitos de valorização financeira/fictícia, nas bolsas de mercadorias dos grandes centros financeiros internacionais.
No topo desses setores/frações estão os grandes monopólios transnacionais, que comandam as cadeias globais de produção. No caso do agronegócio, esses monopólios centralizam a circulação das mercadorias (traders, lideradas por Archer Daniels, Bunge-Viterra, Cargill, Louis Dreyfuss e a chinesa Cofco) e a própria produção, através da monopolização da produção industrial de sementes transgênicas, fertilizantes e agrotóxicos, liderada por Monsanto, Bayer, Syngenta, Corteva e Basf.
É importante destacar também o papel do estado capitalista na regulamentação, no financiamento, nos subsídios fiscais e tributários, nas políticas públicas e na proteção e impunidade da acumulação, reprodução e lucratividade desses setores capitalistas responsáveis diretos e principais pelo atual cenário de colapso ambiental.
Colapso ambiental como fator de reforço e agravamento das crises do capital
Crescentemente as crises ambientais passam a fazer parte das crises econômicas do capitalismo, ao aumentar os custos de produção (reduzindo os lucros), reduzir a oferta de mercadorias (por exemplo, reduzindo a produtividade agrícola), destruir a produção e a infraestrutura (incêndios e enchentes), entre outros. Por exemplo, estudos recentes relacionam a escassez de chuvas no Brasil com reduções da produtividade da agropecuária e do crescimento do PIB, neste caso, em torno de 1 ponto percentual a menos por ano.
Apesar disso, a produção e a concorrência capitalistas permanecem considerando o colapso ambiental como a última de suas preocupações. Seus interesses são reduzir custos, ampliar a produção e os lucros, eliminar concorrentes e concentrar/centralizar capital. Essas tendências são inerentes e férreas no capitalismo. Como consequência, cria-se um ciclo vicioso: a crise ambiental deteriora as condições de produção/reprodução do capital que, em função disso, avança ainda mais agressivamente sobre as condições ambientais para retomar suas condições de acumulação. A abertura de novas frentes de acumulação com a “sustentabilidade” (energias renováveis, reflorestamento, reciclagem etc.) não faz frente àquelas tendências de forma significativa. O colapso ambiental agrava as crises do capital e torna o capitalismo mais destrutivo, e não menos.
Nos últimos anos houve fortalecimento da direita e da extrema-direita, fascista, com suas ideologias abertamente em defesa de uma maior destruição ambiental, em rejeição a todas as descobertas científicas sobre a intervenção determinante das atividades econômicas no meio ambiente e no clima a nível global. Essa é outra dimensão do processo de fascistização em curso e representa a ofensiva aberta do capital também contra a natureza, em evidente ameaça aos povos e à vida no planeta.

Trump exibe a carta às Nações Unidas retirando o país do Acordo de Paris (seguindo o exemplo de Bush em relação ao Protocolo de Quioto). Um dos eixos fundamentais do novo governo Trump é a eliminação da maior quantidade possível de entraves legais à acumulação de capital, inclusive referentes ao meio ambiente, com a revogação de inúmeros acordos e regulamentações ambientais e o estímulo ao crescimento da produção dos mais destrutivos combustíveis fósseis.
O reformismo e o oportunismo das propostas de um capitalismo “sustentável”
“Nada se deve esperar, portanto, dos governantes…
… se quisermos sobreviver como sociedades humanas organizadas e, no limite, como espécie, será preciso derrotar esse poder e constituir um poder político alternativo”.
Luiz Marques. Ecocídio. pgs. 22 e 35.
É mais uma forma de capitalismo utópico a ilusão reformista e oportunista de que o capitalismo realmente existente (destruidor da natureza) possa se transformar no seu contrário, um capitalismo “sustentável”, que limite sua expansão e aumente os seus custos para não agredir o meio ambiente nem ultrapassar a capacidade de regeneração dos biomas e ecossistemas – e, com isso, preservar as condições de existência humana hoje ameaçadas. Para o capitalismo concreto, ainda mais em contexto de crise e acirramento das contradições interimperialistas, as premissas básicas são o imperativo da máxima lucratividade possível e da maior e mais rápida acumulação ampliada do capital – buscando derrubar todos os limites e entraves a esses objetivos, com a ajuda do seu estado. Completam as características intrínsecas do modo de produção burguês a exclusão e a desigualdade, fruto da exploração implacável das massas trabalhadoras, e a destruição da natureza.
Apenas no mundo imaginário do oportunismo, a “sustentabilidade” abriria um ciclo virtuoso de inovação e lucratividade para um capitalismo “verde” e “asseadinho” – mantidos a mesma classe dominante e suas mesmas frações, os mesmos monopólios e os mesmos setores econômicos, e o mesmo estado. A fábula da sustentabilidade capitalista é tão somente um elemento de propaganda e marketing das próprias empresas, buscando “limpar” sua imagem e marca. Da mesma maneira que as diretorias de “diversidade”, a adesão a códigos “sustentáveis” de boas práticas, a emissão de títulos de dívida “verdes” nos mercados financeiros, a criação de fundações e fundos para investimentos “verdes” etc. não alteram no mais mínimo as características dessas empresas, as suas áreas principais de negócio, nem o próprio sistema capitalista.
A propaganda da Vale e a destruição total que a Vale causou em Mariana, Minas Gerais.
A mesma hipocrisia reformista/oportunista está presente nos casos de “veneração supersticiosa do estado” (Engels) como o agente a combater o colapso ambiental por meio de legislação e regulações, financiamento e política tributária, e outros diversos tipos de incentivos. Os estados realmente existentes estão a serviço dos monopólios capitalistas (e não o inverso). Todas as ações “sustentáveis” do estado, portanto, estão presas aos estreitos limites do interesse do capital – que continua agindo concretamente pela destruição ambiental.
Para cada real gasto com a agricultura familiar no orçamento público, quase 10 são destinados ao Plano Safra do agronegócio. A cada 100 reais de multas aplicadas pelos servidores do Ibama por infrações ambientais, apenas 1 (ou menos) entra de fato nos cofres públicos. São os estados capitalistas os que assumem compromissos solenes nos fóruns internacionais, já sabendo que não serão cumpridos, que todos sabem que não serão cumpridos, que não há qualquer intenção de cumpri-los – mas que ganham as manchetes e buscam enganar o povo.
O mais ilustrativo caso recente dessa tentativa de enganação foram dois discursos de Lula, ambos de 2025, de sentidos diametralmente opostos, dependendo do público. Um se dirigia a empresários e políticos locais em busca de votos. O outro foi parte de uma grande festa burguesa internacional, a famosa homenagem do vício à virtude:
“Não é que vou mandar explorar, eu quero que ele seja explorado. … Talvez na semana que vem ou nesta semana haja uma reunião com a Casa Civil, com o Ibama e precisamos autorizar que a Petrobras faça a pesquisa. É isso que nós queremos. Se depois a gente vai explorar, é outra discussão. O que não dá é pra ficar nesse lenga-lenga, o Ibama é um órgão do governo parecendo que é um órgão contra o governo” (Entrevista para uma rádio de Macapá, em 12.02.2025).
“Precisamos de mapas do caminho para que a humanidade, de forma justa e planejada, supere a dependência dos combustíveis fósseis, pare e reverta o desmatamento e mobilize recursos para esses fins. Avançar requer uma governança global mais robusta, capaz de assegurar que palavras se traduzam em ações” (Discurso na abertura da COP30, em 10.11.2025).
Deixamos para o juízo dos camaradas leitores avaliarem em qual dos dois eventos Lula estava mentindo e qual dos seus discursos traduz a prática, critério da verdade, das ações do seu governo (ainda que um tanto encoberta, envergonhada e disfarçada).
“Acordos” globais pelo clima como fraudes
“É uma fraude, realmente, uma falsificação. Basta dizer qualquer bobagem … Palavras sem valor. Não há ação, apenas promessas”.
James Hansen, 2015, sobre o acordo de Paris. Citado por Luiz Marques. Capitalismo e Colapso Ambiental, pg. 55.
As 29 COP anteriores, a atual de Belém, e os demais eventos globais sobre o clima ocorridos nas últimas décadas foram apenas geradores de “promessas”, manchetes e propaganda governamental, empresarial e oportunista, sem qualquer tipo de ação efetiva com resultados concretos para conter o colapso ambiental.
Podemos usar como marco inicial desse processo a pomposamente chamada Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), ou ainda Cúpula da Terra, Cimeira do Verão, ou simplesmente Eco-92 ou Rio-92. Seu principal documento, a Carta da Terra, não foi sequer aprovada, por falta de consenso. A conferência também produziu a Agenda 21, com 40 capítulos de “boas intenções”. Além de outras 3 convenções (biodiversidade, desertificação e mudanças climáticas) e 2 declarações (florestas e meio ambiente), a Rio-92 impulsionou a criação das COP.
Formalmente denominadas Conferências das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, ou Conferência das Partes (COP), as COP são eventos anuais no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima (CQNUMC), desdobramento da Rio-92. A primeira delas, em 1995, em Berlim, na Alemanha, estabeleceu seu cínico mandato para “tomar ações mais enérgicas quanto à mitigação do efeito estufa”.
Uma COP famosa foi a COP3, em Quioto, no Japão, em 1997, que criou o chamado Protocolo de Quioto. Esse protocolo estabelecia compromissos e metas de redução de emissão de gases do efeito estufa. Os países imperialistas deveriam reduzir as emissões em 5% (na comparação com 1990) até 2008-12. Em 2001, os EUA rasgaram o acordo e os demais países imperialistas não o cumpriram. No mundo real, as emissões aumentaram 50% até 2012. A “saída” diplomática foi assinar outro acordo, o de Paris.
Esse novo acordo foi concluído em 2015, na COP21, em Paris, França. A meta – não legalmente vinculante/obrigatória e sem sanções por descumprimento – era de limitar o aquecimento global a 1,5 grau. Como vimos ao longo deste texto, essa meta caminha para ser superada no curto prazo (se é que não já o foi), as emissões e o aquecimento não apenas continuam a crescer como se aceleraram. E os EUA rasgaram novamente, em 2025, o papel que haviam assinado.
Houve ainda inúmeros outros encontros internacionais a cevar a burocracia dos estados capitalistas e dos organismos internacionais, além de receberem fortes patrocínio das próprias corporações poluidoras. Em Johannesburgo, na África do Sul, em 2002, ocorreu a Rio+10, que se provou incapaz de implementar os compromissos de 1992. Dez anos depois, a Rio+20, no Rio de Janeiro, foi a confirmação dessa impotência, com o secretário-geral da ONU encerrando o evento com a confirmação diplomática da sua falência: “Permitam-me ser franco. Nossos esforços não estiveram à altura do desafio”.
Em 2015, a ONU aprovou os 17 Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), cujo saldo não é diferente.
A história das COP, portanto, tem sido a de assinar acordos, sabendo que serão descumpridos, esperar seu descumprimento para assinar novos acordos e assim sucessivamente. E a cada nova meta, já se sabe de partida que são cada vez mais insuficientes (como se fizesse alguma diferença, já que são assinadas para serem descumpridas).
Para a COP30, atualmente em curso, seguimos com a avaliação de Luiz Marques: “A COP29 no Azerbaijão foi o que defini como uma COP zumbi e é difícil adjetivar a COP30, a ser realizada em Belém, em novembro de 2025, dada sua desmoralização” (Ecocídio. pg. 205).
Um importante relatório do site De Olho nos Ruralistas e da Fase, divulgado no dia 10 de novembro, dia da abertura oficial da COP30, reforça a tese da desmoralização desse evento e de seu caráter farsesco e enganador. A “COP dos Lobbies” mostra (uma pequena parte!) as ações dos grandes monopólios – três do agronegócio (Cosan, Marfrig/BRF e Suzano), dois da mineração (Norsk Hydro e Vale), um do setor químico (Bayer) e dois bancos (BTG Pactual e Itaú) – influenciando a pauta do evento e suas decisões, por meio de “patrocínios”, propaganda, financiamento e treinamento da imprensa, relações com entes governamentais etc.
Na COP, nesta como nas outras, são os monopólios do agronegócio, da extração mineral, da indústria e dos bancos que impõem sua pauta aos governos, e não o contrário. Nas mãos da burguesia, o discurso da “sustentabilidade” encobre, debaixo de muita grana, a realidade da destruição ambiental causada pelas próprias empresas que financiam a propaganda. Como afirma com toda a razão o relatório, a COP é um enorme “balcão de ‘negócios verdes’”.
A única saída possível é derrubar o capitalismo!
Não cabe ao proletariado, às massas trabalhadoras e aos comunistas quererem “participar” ou “disputar” esse grande evento da burguesia nacional e internacional que é a COP30. Pelo contrário, nossa posição deve ser a de fazer a crítica radical – o que tentamos fazer neste texto – das raízes mais profundas das atuais crises ambientais (o caráter intrinsecamente predatório e devastador do modo de produção capitalista), mostrar seus culpados (a burguesia e seus governos), denunciar as práticas concretas dos governos para a COP30 (remoção da população, exploração nos canteiros de obras, gastos bilionários para o lucro dos empresários etc.) e mostrar como ela não altera no mais mínimo que seja as duras condições de vida do povo trabalhador, seja no Pará e na Amazônia, seja no restante do Brasil ou no mundo.
Ao denunciar a COP30, denunciamos também seus mecanismos governamentais e financeiros de cooptação e interpelação de um conjunto de movimentos sociais, ONGs e outros, alguns já profundamente corroídos pelo reformismo enquanto outros estão ou de boa-fé enganados pela propaganda governamental e midiática ou ainda buscando sinceramente as “melhoras possíveis” no capitalismo.
A solução para o clima é uma: reforçar a luta das classes exploradas para destruir esse sistema baseado na exploração, na destruição e no lucro! Por isso, o caminho das massas trabalhadoras deve ser inteiramente oposto ao institucionalismo das COP e outros eventos similares. Nosso caminho é o de estar presente nas lutas concretas das classes trabalhadoras, em seus locais de moradia e trabalho, ajudando e participando de sua organização própria, independente e de base, na defesa de suas pautas e de seus interesses. Interesses que são contrários aos dos patrões, dos seus governos e do conjunto de oportunistas que os seguem. Nessas lutas, denunciar de forma intransigente a destruição ambiental causada pelo capital e seus aliados; combater tanto os fóruns de enrolação quanto as forças políticas negacionistas do colapso ambiental; construir redes de ajuda mútua e de solidariedade de classe frente aos eventos climáticos extremos; defender e apontar para novas relações de produção que não sejam baseadas na exploração e na devastação dos recursos naturais.
Para nós, as soluções não estão em medidas dos capitalistas e suas empresas, mas no fortalecimento dos trabalhadores, indígenas, quilombolas, camponeses na luta de classes – eles próprios os que mais protegem os biomas e, ao mesmo tempo, os mais atingidos pelo colapso ambiental. A luta ambiental, assim como a luta contra a exploração, só pode ser bem-sucedidas com a derrubada do capitalismo e a instauração da república dos trabalhadores, o Socialismo!

Povo Kayapó, que luta incansavelmente contra a destruição de mineradoras e facções criminosas em suas terras no estado do Pará.
[1] Exceto quando expressamente indicado, a fonte das análises e dos números deste texto são dois importantes livros de Luiz Marques: “Capitalismo e Colapso Ambiental” (2018) e “Ecocídio. Por uma (agri)cultura da vida” (2025).




