Capitalismo: tempo histórico e suas trágicas formas escravistas de exploração.

Por Augusto Souza; editoração e coautoria: Leonardo Lima Ribeiro

  1. O TEMPO HISTÓRICO É O INIMIGO DO CAPITAL E DA BURGUESIA


Vamos começar por uma grande frase do filósofo Karl Marx, visando entendermos melhor a crise estrutural do capital e a indigência intelectual da burguesia. Marx considerava que “tudo o que é sólido se desmancha no ar”. Considerava que o movimento das sociedades, com suas contradições e ambiguidades, tornam-se parte de leis históricas, as quais se cristalizam e envelhecem no presente. A partir de um dado percurso de tempo, se trata da lei da repetição do mesmo, persistindo em paralelo com os desdobramentos históricos e diferenciações do capital. A crise estrutural do capital, somada às metamorfoses das ideologias hegemônicas, tornou-se insustentável, respectivamente tanto do ponto de vista financeiro quanto intelectual.

A burguesia teria sido revolucionária na França, quando ali se utilizaria do arsenal filosófico de seus intelectuais durante a revolução. O discurso teórico e filosófico da revolução francesa foi utilizado pela burguesia europeia para negar o antigo sistema monárquico medieval. Do ponto de vista moral, que justificaria espiritualmente o desenvolvimento da economia política, a burguesia defenderia a liberdade, a igualdade e até fraternidade, com o objetivo de “destravar” o latente sistema liberal capitalista.


Passados quase 300 anos da revolução burguesa, as promessas de igualdade, fraternidade e liberdade para os trabalhadores nunca vieram a se plasmar. Ressalte-se que, na busca por manter o sistema do capital como objeto de desejo, o fetichismo da mercadoria mantém ainda imersos os trabalhadores num grande processo de alienação.


De todo modo, a burguesia já não possui o controle das crises geradas pelas dinâmicas do capital; não pode impedi-las de avançar. O tempo histórico é seu grande inimigo; sua imprensa e seus pseudointelectuais travam lutas irracionais, beirando a indigência intelectual. Assim, a burguesia dialoga com o senso comum, lá mesmo aonde desaba como personificação do capital em crises cada vez mais agudas.

Ao impor para os dias de hoje um positivismo anacrônico, vinculado ao século XlX, a burguesia tenta dar respostas pelas vias da economia política neoliberal. Ou mesmo liberal da “ordem, e progresso”. O aspecto filosófico e científico humanista é negado em função da mistificação de um sistema em pleno processo de esgotamento e putrefação. Sem dar-se conta que a crise é estrutural em sua totalidade, o negacionismo burguês se torna uma espécie de “ciência autoirônica”.


O tempo histórico, pensa a burguesia, é uma lei dada sob seu comando teológico. Mas o movimento da história é impiedoso, tanto com a burguesia quanto com sua imprensa. Não operam mais com realidades concretas, apenas ruminam o senso comum de seus pares.

2. AS TRÁGICAS FORMAS ESCRAVISTAS DE EXPLORAÇÃO DO CAPITALISMO


O processo de nascimento do capitalismo, ainda em seus lampejos de amadurecimento da lógica da acumulação, emerge das entranhas terminais da escravidão.

Na Inglaterra capitalista do século XVlll, o uso intensivo do trabalho forçado, em condições subumanas, foi o fator de alavancagem do capital em seu nascedouro.
Por conseguinte, o capitalismo traz consigo o trabalho assalariado juntamente com as formas compulsórias de trabalho escravo, que estão aí até hoje, sobre a capa envernizada de trabalho livre com alto grau de exploração. No passado recente, tais formas análogas a escravidão foram usadas antes da mecanização pela lavoura da cana de açúcar.


O caso das vinícolas da serra gaúcha não surpreende. A descoberta da existência de mais de 200 trabalhadores sob condições análogas à escravidão, trabalhando de formas desumanas, insalubres. São trabalhadores do Nordeste, esmagados pela indústria da uva. No período da colheita são utilizados como escravos. Sim, como escravos, em pleno século XXl.


O capitalismo traz consigo e preserva no presente as formas mais desumanas de trabalhos herdadas do passado, utilizadas sem nenhum pudor. A extorsão por meio da mais-valia, manufaturada pelos escravistas modernos das vinícolas da serra gaúcha, não difere em nada das antigas formas de escravidão, utilizadas no nascedouro do capitalismo inglês. Ali, os trabalhadores sofriam torturas, sem falar da insalubridade e condições indignas de moradia. A história do capital traz consigo a persistência da sede de acumulação desenfreada, inerentemente antiética. Trata-se dos escombros que desvelam o fardo da escravidão como testemunho vivo, envernizado juntamente com a servidão assalariada.

É importante salientar que as vinícolas em questão, como as que estão associadas à Salton, Garibaldi e Aurora, tiveram somadas um faturamento bruto de aproximadamente um bilhão de reais. São empresas de grande porte, exportadoras de vinhos e espumantes. Tal monta de capital revela sintomaticamente um processo de acumulação, ao partir da utilização de mão-de-obra análoga à escravidão. No curso médio de suas existências usam alto grau de extorsão da mais-valia sobre os trabalhadores, plasmando a acumulação do capital considerado de grande porte.

É preciso denunciar e tornar pública a história “épica” de tortura protagonizada pelos empresários das vinícolas. São personificações do capital acumulado, com base na exploração mediante mais-valia. Longe estamos de obra do acaso, já que diz respeito à riqueza cuja seiva advém do sangue dos trabalhadores. O capital avança materialmente por meio do espiral temporal que promove o retorno das suas origens. O avanço do retorno da mesmidade do capital expressa a contínua pretensão da contenção da queda tendencial da taxa de lucro. O avanço da volta ao mesmo processo vicioso, exploratório e escravagista está significativamente vinculado à crise estrutural que persiste transhistoricamente na marcha do tempo. Desta feita, a retomada da escravidão “compensa” as perdas e engendra uma taxa de acumulação temporariamente ampliada.

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